Andai como filhos da luz
Considerando o versículo: "Porque noutro tempo éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor; andai como filhos da luz" (Efésios 5:8), tomarei a dicotomia luz x trevas para compartilhar algo a respeito da conduta do verdadeiro filho da luz.
Há duas maneiras de nos tornarmos filhos: sendo gerados ou adotados. Os filhos da luz são gerados de uma semente incorruptível, no Senhor, a verdadeira semente divina. Não que sejamos já completamente transformados, mas o vocábulo 'andar' nos sugere que enquanto caminhamos expressamos nossa pertença, ou seja, de que natureza somos. No contexto de apresentação desse versículo Paulo apresenta o Pai como nosso exemplo de amor e de pureza. E já no primeiro versículo do capítulo 5, Paulo nos exorta a sermos imitadores de Deus como filhos amados. De que forma seria esse andar?
1) Em amor - como também Cristo nos amou. Então a lógica seria: você deve tratar o próximo como Cristo tratou você. Se ele te amou, você deve também amar. Esse exemplo ele demonstrou em algumas de suas parábolas. Vejamos a parábola do Samaritano. Lucas inicia essa parábola dizendo que "se levantou um certo doutor da lei [significa que era instruído na lei dada por Deus a Moisés] tentando-o, e dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida eterna?". Interrogado por Jesus sobre o que dizia a lei a respeito, o doutor recitou o primeiro grande mandamento: "Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo". Bem, ele já sabia a resposta. Mas o próximo versículo diz que ele tentava justificar-se a si mesmo. Em outras palavras, ele disse: Se eu soubesse quem é meu próximo [...]. Mas Jesus conhecia o coração do doutor da lei. Contou-lhe a parábola e no final disse: "Vai, e faze da mesma maneira". Lucas 10: 25-37.
A ironia da parábola está justamente no fato de um samaritano ter tratado com amor um judeu que tinha sido assaltado e espancado por salteadores, abandonado à beira da estrada quase morto e, mesmo assim, foi desprezado por um sacerdote e um levita. Se fôssemos usar uma dicotomia para judeu, seu antagônico seria samaritano. No contexto histórico, a Bíblia revela que, após a velhice, Salomão, sucessor de Davi, havia amado muitas mulheres e estas lhe perverteram o coração. Salomão tornou-se idólatra e ergueu um altar a pedido de suas mulheres princesas pagãs [a Bíblia diz que ele teve 700 esposas]. Elas traziam consigo os seus deuses e Salomão os adorou. Como consequência, o Senhor dividiu o reino em duas partes: Norte, chamado Israel, composto por 10 tribos e cuja capital era Samaria; e Sul, chamado Judá, com apenas duas tribos, cuja capital era Jerusalém. Os Reinos continuaram divididos até a destruição de ambos. Judá foi governado por muitos reis infiéis a Deus e ímpios, mas outros fiéis. Já Israel foi governado por reis idólatras, assassinos e cruéis. Eles se misturaram com as mulheres de nações vizinhas e não eram mais 'puros'. Os samaritanos eram israelitas que contraíram matrimônio e costumes pagãos. Ambos os reinos eram inimigos.
Por isso que, ao contar a parábola, Jesus fez questão de frisar aos judeus que o ato de bondade do samaritano havia superado aquele do sacerdote que "vendo-o [o que havia sido assaltado e espancado], passou de largo" (v.31b); e aquele do levita que também passou de largo. Tanto o sacerdote quanto o levita não demonstraram amor e nem compaixão pelo próximo. Se fosse um samaritano caído e à beira da morte, talvez o sacerdote e o levita até pensassem que aquilo havia sido um castigo. O matariam e o enterrariam. Mas sendo ele judeu, havia uma obrigação moral para com seu irmão.
Jesus diz em Mateus 5:20 "Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus". O escriba era um doutor da lei, instruído para interpretá-la e usá-la de maneira justa. Mas o que vemos na leitura dos evangelhos é que eles não faziam com justiça e por causa disso Jesus os repreendia o tempo todo. A maioria deles se aproximava de Jesus para tentá-lo e para encontrar alguma coisa mediante a qual poderiam julgá-lo e condená-lo à morte. Os escribas e os fariseus buscavam sempre ocasião para prender Jesus. Os fariseus eram tão formalistas em sua maneira de observar a Lei que Jesus os chamava de hipócritas. Tanto fariseus quanto escribas tinham a obrigação de praticar a justiça de Deus e não de usá-la em benefício próprio, em nome de Deus.
Os levitas eram descendentes de Levi que tinham o encargo de cuidar do templo e de seus utensílios. E os sacerdotes ficavam responsáveis pelo sacrifício de animais como oferta a Deus. Todos eles tinham encargos na casa do Senhor. Mas eram apenas legalistas no pior sentido do termo. Não havia em sua prática a misericórdia e nem o amor.
2) Em temor - em sujeição a Deus e ao próximo. O vocábulo 'temor' sugere respeito e obediência. Sujeitar-se está em oposição a dominar. Sujeitar-se à vontade de Deus e ao Seu governo é o mesmo que negar a si mesmo, um pré-requisito para todo aquele que deseja seguir a Cristo, ou seja, ser cristão, ser filho da luz, ser filho de Deus. No evangelho de Marcos 8:34 Jesus disse: "e chamando a si a multidão, com os seus discípulos, disse-lhes: Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz, e siga-me".
Em primeiro lugar, só podemos seguir a Jesus, ou sermos chamados de cristãos, se e somente se, negarmos a nós mesmos. Nesse contexto Jesus estava predizendo o que aconteceria com ele: que seria entregue aos malfeitores, seria humilhado, insultado, julgado injustamente e depois morto. E ir após o nosso Senhor significa também sermos entregues aos malfeitores, sermos humilhados, insultados, julgados injustamente e também mortos. Foi o caminho percorrido pelo Mestre. É o nosso caminho. E a nossa 'primeira' morte ao conhecer o Senhor é morrer para nós mesmos.
O servo do Senhor não tem vida em si mesmo. A nossa vida passa a ser a vida do próprio Senhor em nós porque fomos regenerados, ou gerados de novo, de semente incorruptível, logo, a nossa vontade passa a ser a vontade de Deus: que nos amemos uns aos outros; que não sejamos orgulhosos; que nos humilhemos; que nos entreguemos a um caminho cheio de espinhos, mas com um fim glorioso. Porque a recompensa e a glória daquele que serve a Deus não é na terra, porque as coisas terrenas são passageiras e as celestiais são eternas.
Todo aquele que é filho das trevas está em oposição ao amor e ao temor ensinados na Bíblia. Os filhos das trevas [treva fala de ignorância espiritual] são manifestos pelas suas obras: fornicação [prática sexual fora do matrimônio], e toda a impureza ou avareza, torpezas [indecência, obscenidade, baixeza], parvoíces [idiotice, imbecilidade], chocarrices [insolência]. Os filhos da desobediência são devassos [libertino e licencioso], impuros, avarentos, que é idolatria, e eles não têm parte no Reino de Cristo e de Deus. (Efésios 5:3-8).
Todo aquele que é filho da luz vive o oposto disso. Seu fruto é o fruto do Espírito, manifesto em toda a bondade, e justiça, e verdade, aprovando o que é agradável ao Senhor. (Efésios 5:9-10). Vivendo na prática, aprovando e não questionando.
Hoje vemos pessoas que querem dar uma nova 'cor' aos atos de (in)justiça. Há pessoas que diz que entre o preto e o branco existem milhões de cores. Sim, mas o que é o branco senão a ausência de todas as cores ou pigmentos? O que é o preto, senão a presença de todas as cores ou pigmentos? Quanto mais pigmentos, mais forte é a cor e mais se aproxima do preto. Mas se o branco tiver qualquer pigmento ele deixa de ser branco. Foi isso que Jesus disse em Mateus 16:6 "acautelai-vos do fermento dos fariseus e saduceus". E logo depois Paulo diz ao Gálatas 5:9 que "um pouco de fermento leveda toda a massa". Significa que nossas ações diante dos homens devem ser com toda a bondade, justiça e verdade. Qualquer um que deseja seguir a Cristo precisa mostrar seus atos em bondade, justiça e verdade.
Quem ama e teme a Deus pratica a bondade. Deus me ama, então devo amar também, isso é ser imitador de Deus. Deus é bom, então devo praticar atos de bondade, ainda que eu, em essência, não seja uma pessoa boa. Deus é justo. Logo, também devo praticar atos de justiça para com o próximo, mesmo que isso signifique abrir mão dos meus próprios direitos. Deus diz sempre a verdade pra mim, então por qual razão eu deveria mentir ao meu próximo?
O que seria o amor? bem, na primeira carta aos Coríntios Paulo descreve o que é o amor. Mas antes de descrevê-lo, Paulo menciona algumas condições para que minha justiça seja em amor. Ele diz:
Ainda que: i) eu falasse a língua dos homens e dos anjos; ii) eu tivesse o dom de profecia e conhecesse todos os mistérios, e toda a ciência; iii) eu tivesse toda a fé; iv) eu distribuísse toda a minha fortuna; v) eu entregasse o meu corpo para ser queimado.
Sem amor nada disso me aproveitaria. As profecias diante do amor serão aniquiladas; as línguas na presença do amor cessarão; A ciência onde há amor desaparecerá. O amor nunca falha. A Bíblia diz que Deus é amor. Deus é maior que tudo. Ele é Supremo. Seus filhos devem imitá-lo. Se Deus é amor, Cristo é amor e nós devemos ser amor. Se eu posso ser amor, mesmo por imitação ao que Deus em Cristo faz, então todas as coisas são possíveis. Mas sem amor tudo é em vão. Nossa fé será em vão se eu não puder praticar o amor. Quem ama não mata, não mente, não trai, não engana, não é desleal, não se porta de modo indecente. O amor é sofredor, é benigno, não é invejoso, não trata com leviandade, não se ensoberbece. O amor não busca seus próprios interesses, não se irrita, não suspeita mal. Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade. O amor tudo sofre, tudo crê, tudo espera. (I Coríntios 13).
Quando praticamos essas coisas damos provas de que somos filhos da luz e não das trevas, porque conhecemos a Deus e dele somos conhecidos. Quando praticamos essas coisas demonstramos que nossa natureza foi transformada e nossa raiz não está mais fincada na terra, mas sim, temos um tesouro nos céus para onde desejamos ir. Desse modo demonstramos amor, como o bom samaritano, até pelos nossos inimigos. Se Deus me amou, devo amar também. Se Deus entregou seu Filho Amado por todos nós, tenho que reconhecer que não sou mais especial, mas sim, mais obediente, cheio de amor e temor a Deus. É desse modo que os cristãos devem ser reconhecidos no e pelo mundo.Se nossas ações demonstram o amor, a bondade e a justiça de Deus ninguém jamais blasfemará o nome de Deus por nossa causa. Porque é só no Senhor que conseguiremos ser luz.
Deus abençoe sua vida.
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